sexta-feira, 19 de fevereiro de 2021

EU VIVI OS GOVERNOS MILITARES

            Não estou aqui para defender ou condenar o período em que o Brasil foi governado por militares. Apenas para expor o que testemunhei e o que entendi. Vou deixar o julgamento de bom ou ruim para cada um. Mesmo porque não acredito na divisão maniqueísta do mundo entre bom e mau.

 

            Foi uma época que se tinha um grau de liberdade bastante amplo. Tínhamos liberdade de fazer coisas que hoje são proibidas e patrulhadas. Nossa liberdade de agir era limitada apenas pelas leis. Algumas mais rígidas, outras mais flexíveis, mas razoavelmente cumpridas.

 

            Porém havia uma coisa que não se podia fazer, criticar o governo e a ordem vigente. A “subversão” era severamente combatida. Leis foram criadas para combater os chamados “crimes de opinião”. Excessos e crimes eram cometidos para coibir os “ataques subversivos”. Os governantes foram ativos ou coniventes com arbitrariedades (sf. Ação em que há uso abusivo de autoridade; violência ou despotismo) em nome da lei e ordem. Esta faceta da época militar teve e continua tendo a minha desaprovação pessoal e nenhum discurso que a justifique vai mudar a minha opinião.

 

            O que me assusta no atual caso da prisão do deputado é a desconfortável sensação de Déjà Vu. Testemunhamos uma pessoa que teve a sua liberdade sumariamente suprimida por ter expressado uma opinião contrária a um poder constituído do país. Como não assisti o vídeo, não posso me posicionar contra ou a favor da opinião desta pessoa; sequer posso opinar se ouve ou não crime naquilo que foi postado. Porém entendo que existe um rito legal onde este suposto delito deve ser apurado, processado, julgado e punido se assim for decidido, tudo sobre a égide da ampla defesa. Repito a assino abaixo do dito atribuído a Voltaire: “Eu discordo do que você diz, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-lo”.

 

            O que me agrada na situação é ver um político sendo responsabilizado por aquilo que diz e prega. Porém o que me desagrada profundamente é ver a casa que confio para a nossa defesa ampla contra erros e arbitrariedades passiveis de ocorrerem no judiciário, aplicando de maneira questionável as leis que juraram defender para suprimir o direito individual da mesma forma que já vi acontecer no período militar. E mais, este alongamento interpretativo legal é o mesmo usado para aliviar o peso das leis sobre os seus pares.

 

            Precisamos de um Legislativo que legisle, um Judiciário que apure e puna, um Supremo que fiscalize e um Executivo que administre sem que fiquem disputando poder e beleza. Tenho fé e esperança que estas distorções sejam corrigidas e o país possa tem uma maior estabilidade, tornando-se um lugar onde as leis sejam iguais para todos e que nenhum cidadão seja mais igual do que o outro. 


Walter Kauffmann Neto